Escrever histórias 100 palavras

As histórias fazem parte do nosso universo, mesmo quando já somos crescidos por fora. Escrever histórias é uma das formas de conseguir sobreviver ao mundo dos crescidos. Helena Artur é o pseudónimo da Joana Quinta

sexta-feira, janeiro 20, 2012

TRECHO DE UM TEXTO (2)




Antes de mais perdoa-me a letra titubiante. O combóio pode ser alfa, mas a linha, no mínimo é Omega para não dizer Zeta.
Pronto... mais uma viagem, mais uma corrida.
Passei uma noite horrível.
Como previste não me consegui adaptar ao colchão nem à tua falta.
Debati-me entre um quarto muito quente, um colchão muito mole, uma saudade muito dura, uma televisão com muitos canais e sempre tu. Sempre tu.
Achei que estas poucas horas solitárias me ajudariam a arrumar esta cabeça. Faltam duas horas para chegar a Lisboa e não o consegui.
Ninguém está livre do passado. Mas a verdade é que também ninguém tem que viver exclusivamente em função disso. No entanto, eu não acredito no presente.
O presente é criar motivos que valha a pena recordar. O presente é investir o suficiente na memória, na imortabilidade.
Tenho a certeza que a minha razão de ser não está na aprovação dos que me rodeiam. E ainda bem. Mal estaria. No entanto, sei que procuro, nas coisas que faço, uma razão para a minha existência.
Não me peço grandes façanhas. Mas exijo de mim uma relativa autoridade face ao exigente momento que me rodeia.
Acabo por ter necessidade de fazer coisas que gosto, mas sem grande prazer, no intuito de ter uma maior disponibilidade.
Só que o tempo não estica.
Para que serve perceber o fenómeno islâmico no mundo árabe? Para que serve perceber as semelhanças entre o estruturalismo católico da Polónia e a irreversabilidade do poder do Islão?
Para nada!... responderá quem não percebe que viver é saber.
Nada! para quem acha que é espectador da sua própria realidade.
Pensar é um exercício que precisa de continuidade. E que precisa de ser trabalhado com critério. Um exercício constante feito no mau sentido só vai agravar a deficiência.
Por vezes, apetece-me ser incongruente. 
Deixar tudo, manter o essencial e viver só a teu lado. Eu não seria eu, tu não serias feliz.
Viver é partilhar. É trocar experiências, é encontrar em cada diferença razões para crescer.
É espantoso. Mesmo continuando a doer acredito que a vida é a síntese permanente entre diferentes formas de ser.