Escrever histórias 100 palavras

As histórias fazem parte do nosso universo, mesmo quando já somos crescidos por fora. Escrever histórias é uma das formas de conseguir sobreviver ao mundo dos crescidos. Helena Artur é o pseudónimo da Joana Quinta

sábado, março 25, 2006

PASSAGEIROS



















No fim de semana passado fui com os miúdos almoçar a um dos sítios mais bonitos de Cascais.
Imagina estar no cimo de um monte, onde podes rodar sobre ti mesmo 360 graus e tudo o que vês é azul e verde.
Azul do céu, azul e verde do mar; azul do céu e verde das copas das árvores que se espraiam aos teus pés num aconchegante chão verde.
E assim, avistando todas estas dádivas imensas, ali estivémos nós conversando, tagarelando, pondo e despondo do que seria ou não das nossas vidas, o que fizémos menos bem e muito mal, enfim, abraçando o tesouro que a vida nos deu: o amor.
A certa altura os miúdos- faça-se justiça, os adolescentes!- falavam de namoros e namoricos, curtes e coisas mais sérias, e chegámos à conclusão que podíamos considerar que a vida é como um comboio.
Um comboio? Estou mesmo a ver a tua cara de espanto!
Sim, um comboio. Com arranques e paragens, variaçõs de andamento - por vezes rápido, outras vezes nem tanto- paragens, umas forçadas outras premeditadas, e, finalmente a chegada a um destino.
Nenhum deles queria falar do destino, como é óbvio! Demasiado deprimente disseram!
Mas falámos das variadíssimas paragens nas várias estações onde entravam e saiam pessoas.
Dessas pessoas, desses sentimentos, dos acontecimentes recorrentes que compoem e fazem, por vezes desfazendo, a nossa vida.
Decididamente concluímos que as pessoas entram e saiem da nossa vida.
Ou entram e ficam até ao fim da viagem...ou saem umas paragens a seguir para apanharem outros comboios, com outras pessoas dentro, que por sua vez já vêm de outras paragens onde largaram outras carruagens....
A conversa girava e fervilhava.
As pessoas, os comboios, as dádivas, os sentimentos, o futuro.
Tantas coisas para pensar e viver na vida destes jovens! Tanta vida à frente, tantas paragens, tantas estações com magotes de pessoas para entrar!
Dentro do comboio as pessoas viajam com todas as dádivas da vida: a dádiva da escolha, a dádiva do amor, a dádiva da dor, a dádiva da morte, a dádiva da espera, a dádiva do prazer, a dádiva do errar e a de emendar a mão.
No restaurante, normalmente silencioso e calmo, gerou-se uma tal tertúlia que alguns dos clientes sorriam e cuidadosamente, alguns a medo, puseram-se a ouvir e até chegaram a dar palpites.
Foi muito engraçado. Encheu o coração de calor e de prazer.
Por fim, já estávamos na hora do lanche, e continuávamos a palrar que nem pintassilgos tontos.

Sabes, a conclusão a que chegámos foi a seguinte: independente de todas as outras considerações, a verdade é que as pessoas entram na nossa vida por acaso, pelo menos aparentemente. Mas não é por acaso que algumas delas permanecem.

Feliz aniversário