FALA-ME DE SENTIMENTOS
Quanto tempo teria já passado desde que fechara atrás de si a porta do quarto alugado? Era importante? Não, não era. Hoje ninguém mais a esperaria.
A pele era só uma e cobria-os. Antes desejosa, agora pegajosa, um pouco húmida ainda. Era o repouso do suor depois de amar desesperadamente.
Disse que sim. Prometeu que lhe escreveria uma carta se a deixasse dormir um pouco. Estava cansada.
"Sim, meu amor, dorme que velarei o teu sono. Ver-te-ei dormir, adormecendo contigo o mundo. Mas promete-me que escreves mesmo uma carta. Para mim, como se estivesse fora há muito tempo. E contar-me-ás de ti. Falar-me-ás de sentimentos. Escreve-me".
Mariana adormeceu.
Apressada Mariana desceu do táxi. Nem sequer abriu o chapéu de chuva apesar da água que escorria do céu.
Percorreu o extenso corredor por demais conhecido. O cheiro da alcatifa velha, cansada de milhares de passos apressados, tinha o condão de a fazer estremecer por antecipação pelo prazer que sabia ir encontrar. O seu amado ali estaria, invariavelmente, cumplicemente à sua espera e fariam amor até de madrugada.
O dia seguinte seria como sempre penoso: pelo cansaço e pelo afastamento.
Amavam-se. Compreendiam-se e fugiam do resto do mundo.
Aquelas horas eram suas. Aqueles momentos de mais ninguém.
Ouvia a voz do seu amante por muito que não existissem sons além do surdo e abafado bater dos saltos dos seus sapatos na estafada alcatifa amarelada. Como podia ouvir tão bem as suas palavras, as que iriam arrepiar a sua nuca se ainda nem havia chegado à porta do quarto 107. Sempre o mesmo 107...os números de um lado da porta e do outro os lábios que de lhe molhariam a nuca e as orelhas.
"- Mar...pensei que já não vinhas...demoraste, amor. Vem, anda, mostra-me o teu pescoço. Quero mordê-lo...Mar..."- e partiriam para a vertigem dos sentidos até cairem sem rede na colcha vermelha da cama do hotel.
Arranhá-lo-ia em jeito de tatuagem tal era forte a dor de o ter só por momentos, por horas, por dias. Ele amá-la-ia até à exaustão, faria dela flor, actriz, donzela e dar-lhe-ia o sol, a vida e eternas experiências de morte. Muitas. Mais e mais até o controle da respiração quase desaparecer.Ouvia a voz do seu amante por muito que não existissem sons além do surdo e abafado bater dos saltos dos seus sapatos na estafada alcatifa amarelada. Como podia ouvir tão bem as suas palavras, as que iriam arrepiar a sua nuca se ainda nem havia chegado à porta do quarto 107. Sempre o mesmo 107...os números de um lado da porta e do outro os lábios que de lhe molhariam a nuca e as orelhas.
"- Mar...pensei que já não vinhas...demoraste, amor. Vem, anda, mostra-me o teu pescoço. Quero mordê-lo...Mar..."- e partiriam para a vertigem dos sentidos até cairem sem rede na colcha vermelha da cama do hotel.
Quanto tempo teria já passado desde que fechara atrás de si a porta do quarto alugado? Era importante? Não, não era. Hoje ninguém mais a esperaria.
A pele era só uma e cobria-os. Antes desejosa, agora pegajosa, um pouco húmida ainda. Era o repouso do suor depois de amar desesperadamente.
Desesperadamente à procura um do outro, como se aquela pudesse ser, mais uma vez, a última. " - Pode sempre ser a última vez que te vejo! Pode sempre ser a última!"- costumavam dizer um ao outro.
Talvez por isso Mariana sempre sorria quando encontrava alguém de quem gostava. Era mais uma chance que tinha de estar com o encanto de quem se quer bem, de quem se gosta, de quem nos é agradável. Podia sempre ser a última vez e tinha a sensação que as pessoas disso se tinham esquecido há muito.
"- Mar..? Conhecemo-nos desde quando?"- perguntou-lhe baixinho, num sussuro, enquanto lhe afagava a face e os cabelos. "- Verdadeiramente já perdi a conta aos anos, aos dias...!"
Mariana acordou de levezinho e enrolou a sua perna na dele em sinal de resposta. Nem ela sabia já. Também tinha perdido a conta aos anos, aos dias, às desilusões e aos prazeres dos reencontros. Às suas mortes.Disse que sim. Prometeu que lhe escreveria uma carta se a deixasse dormir um pouco. Estava cansada.
"Sim, meu amor, dorme que velarei o teu sono. Ver-te-ei dormir, adormecendo contigo o mundo. Mas promete-me que escreves mesmo uma carta. Para mim, como se estivesse fora há muito tempo. E contar-me-ás de ti. Falar-me-ás de sentimentos. Escreve-me".
Mariana adormeceu.
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