Acariciava-lhe a cabeça, percorria com
os dedos o contorno esbelto do pescoço. Roçava-lhe com as faces as
penas macias, encostava-lhe o ouvido ao peito e escutava o pulsar
ansioso do seu coração.
No olhar via-lhe ao mesmo tempo fogo,
doçura, pânico e tranquilidade; que estranho tropel de sensações,
que vibrações provocavam nele que as julgava mortas há muito
ou, pelo menos, acorrentadas à lógica do senso comum.
Que descortinar de um sentir novo,
louco, arrebatado e honestamente incoerente.
Mas um dia a bela ave quis partir e
então o homem, mordendo os lábios, sentindo na garganta uma
tremenda angústia sufocada, retendo nos olhos um orvalho de
tristeza, deixou-a ir.
Numa tarde de Agosto o homem abriu os
braços, retalhou o peito, cerrou os olhos, sufocou o grito e deixou
a ave voar.
Ficou a vê-la afastar-se, elegante, graciosa como uma bola de sabão que se vê subir no céu, como um balão colorido que se escapa das mãos de uma criança.
Ficou a vê-la até à ilusão de que ainda a via.
Depois seguiu, só, triste todo virado
para o seu mundo interior, muito seu, felizmente seu.
Os olhos da alma do homem estavam
pregados ao céu azul à espera de a ver voltar, para de novo a
prender nos seus braços e nunca mais a deixar partir.
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