Escrever histórias 100 palavras

As histórias fazem parte do nosso universo, mesmo quando já somos crescidos por fora. Escrever histórias é uma das formas de conseguir sobreviver ao mundo dos crescidos. Helena Artur é o pseudónimo da Joana Quinta

quarta-feira, março 07, 2007

O MEU TRAVESSÃO NOS TEUS CABELOS



Há uns meses atrás a minha filha Mariana telefonara-me para Paris. A voz dela continuava parecidíssima com a minha. Quantas vezes ao longo dos anos confundiram telefonicamente as nossas vozes. E com o mesmo nome, as confusões ainda aumentavam mais criando, por vezes, situações caricatas.
Telefonara-me perguntando pelo meu travessão de "marcassites". A Ana queria usá-lo para prender o véu de noiva.

“- Claro que sim! Claro que gostaria muito que o usasse...”- fiquei contente com o pedido.

“-Está aí em Lisboa, no Areeiro... no guarda-jóias dentro do armário do meu quarto. Podes ir lá buscá-lo para verem se lhe fica bem.... A Ana lembra-se assim tão bem dele? Poucas vezes o usei nos últimos anos”- continuámos a conversa telefónica.

Quando pousei o auscultador infalivelmente recordei-me do travessão e de como mo deras. Tinha sido há muitos anos, meses depois de regressarmos da primeira viagem que fizémos a Madrid.

“ –Afinal o que representei para ti e para a tua vida? No início pensavas que íamos ficar juntos? Que o nosso caso duraria tantos anos?- perguntavas-me ao ouvido.

“-Sempre foste uma provocação para mim! Nem sei bem dizer o que representavas para mim quando nos conhecemos”- disse soltando uma gargalhada.

“-Provocação? Como assim? Explica melhor”- pediste.

“-Sabes bem que fiquei perturbada quando te vi e quando ia às tuas aulas ficava a olhar para ti de soslaio para ninguém notar...nem tu! - recordei meigamente.

“-Provocação ou tentação?”- provocaste-me novamente.

“- Hum... deixei-me levar até onde o meu coração me mandou... e a tentação me impeliu! E fui sempre dar até ti. Foste o que posso chamar de karma positivo!”- foi a minha vez de te provocar.

“- Quando tocavas a campainha do portão ia sempre ver-te da varanda, sabias? Subias a dois e dois os degraus da escada de tão apressada que estavas! Depois ia por-me à porta, à tua espera, como se ainda não te tivesse visto. Vinhas sempre afogueada e cheia de vontade de mim!”- lembraste-me.

“-Sim, meu amor, começaste por ser uma fantasia ou um sonho. E tudo ficou tão importante entre nós que tornaste-te numa paixão sem a qual era impossível viver. Significaste o meu e o teu amor juntos, fizeste vir ao de cima o que eu tinha de melhor”.

“- Queres casar comigo, princesa?”- perguntaste não esperando pela resposta para me ofereceres um travessão lindíssimo em “marcassites”.

“- Nenhuma mulher apaixonada resiste ao pedido de casamento do homem que ama!”- apanhei os cabelos com ambas as mãos e coloquei o travessão.

“-Mas tu és diferente. Nunca se sabe o que dirás, o que farás...és uma caixinha de surpresas. Também por isso te amo, Mar...minha pequena Mariana”- disseste emocionado.

“- No amor e no amar sou igual a qualquer mulher apaixonada!”.