MERGULHAR
Atirei-me
sem medo. Já conhecia aquele mar, aquelas marés, aquele silêncio contendo os
meus sons e também os meus ruídos.
Os
ouvidos tornaram-se e mergulhei no mundo de mim. Não que tivesse deixado os
outros de fora dos meus sons e ruídos…eles estariam sempre lá, mas
acolhê-los-ia dentro do meu peito com aquele baloiçar que o mar nos dá.
Quase
sem me mover fui pairando em suavidade, naquela paz como se não fizesse parte
do mundo real. Não, engano meu, o mundo, os problemas, as dores dentro do
peito, os amores e desamores, as angústias e alegrias flutuavam também dentro
de mim, mas cá dentro do peito as ondas ficaram mais meigas, mais suaves, mais
amigas.
Não
me forcei a não chorar deixando as lágrimas corroerem-me as entranhas.
Deixei-as
correr misturando-se com o manto azul que as atendeu nas suas mãos. E os meus
olhos tornaram-se da mesma cor.
“-
Ah, o tempo vai ajudar-me” – pensei enquanto sentia os abraços da água no meu
corpo tão dorido e magoado.
Mas
o tempo só ajuda se o ajudarmos a ele.
“-
É tão difícil!” – falei comigo mesma no meu mar de silêncios. “ – E quem me
prometeu que aceitar, rearrumar, sentir, viver, amar e ter consciência seria
fácil? Ninguém!”
Vim
à superfície da água e percebi que o tempo não tem tempo; de contrário não
teria aguentado tanto lá em baixo.
Em
cada um de nós o tempo tem o seu tempo, o seu embalo, o seu amor e as
descobertas dos seus trilhos.
Lá
fora os ruídos feriam-me os ouvidos…”- Mergulho novamente? – pensei.
Seria
tentador fazê-lo vezes sem conta mas cá fora era o lugar onde tinha de viver.
Mas sabia poder voltar sempre e isso apaziguou-me o peito.
O
peito onde mora o coração, onde se refugiam as dores e as alegrias. Onde
estamos e somos.
Nadei
até à rocha e sentei-me ao sol de olhos fechados.
Brilhava
mais e o coração batia compassado.
Ergui
as pálpebras e esqueci-me do meu nome. Não interessava qual era.
Era
eu com o mar nos olhos, a poesia nos dedos e a imensidão no sorriso.